Publicado por: João Frigerio | 7/fevereiro/2009

Controle de salários no futebol

Olá amigos do F&N!

Nesta segunda e terça-feira acontecerá aqui em Genebra, na Suíça, a assembléia geral da Associação Européia de Clubes de Futebol (ECA), entidade que veio a substituir o grupo lobístico G-14.

A grande diferença da ECA para o G-14 é que a atual organização não representa apenas os 18 maiores clubes da Europa, mas conta com mais de 100 membros de todos os países europeus.

Uefa

E o grande assunto que promete chamar a atenção de todos é a discussão sobre um possível teto salarial europeu para ajudar os clubes a controlar suas finanças.

Teto salarial (salary cap, em inglês) é uma coisa comum em vários esportes profissionais. É bem conhecido nas ligas profissionais norte-americanas (como NFL, NBA, MLB e NHL), mas também existe no rugby (union e league) no Reino Unido e em outros países e esportes.

Mas qual o benefício de um teto salarial no futebol?

Do ponto de vista dos clubes, o teto salarial é um artifício importantíssimo para se controlar gastos e a saúde financeira dos clubes. Do ponto de vista esportivo, o limite de gasto para todos os clubes faz com que a diferença de qualidade e capacidade de vencer entre poucos clubes grandes e muitos pequenos diminua, já que os grandes clubes não poderiam mais “comprar” todos os grandes jogadores pois extrapolariam o limite salarial estabelecido. Isso faz com que as forças sejam mais bem divididas, o que em geral, faz bem ao espetáculo como um todo (e que pode gerar ganhos para os clubes em aumento de público nos estádios, mais interesse e, portanto, mais dinheiro proveniente da televisão etc.).

Obviamente, o que é vantagem para uns pode ser desvantagem para outros. Os jogadores seriam os primeiros prejudicados, simplesmente por terem um limite imposto ao seu potencial de ganhos. Outro grupo que nunca foi a favor de um teto salarial no futebol foram os grandes clubes (e imagino que grande maioria dos seus torcedores). Afinal, em teoria, uma competição onde todos tenham condições de vencer parece ser o modelo ideal, mas vá perguntar aos torcedores do Lyon, por exemplo, se eles estão cansados de vencer o Campeonato Francês (já são 7 títulos seguidos e parece que o oitavo é só uma questão de tempo). O que cada clube quer é se manter no topo e cada vez mais distante dos rivais.

Então, por que agora os clubes resolveram considerar o assunto?

A atual crise financeira certamente me parece um fator importante. Donos de clubes que antes não tinham problemas em cobrir os prejuízos de seus clubes, simplesmente aportando capital proveniente de outros negócios, agora já pensam duas vezes antes de comprometer somas importantes de seus patrimônios.

Mas outras crises já aconteceram e não creio que esse seja o fator primordial. Acho que um dos acontecimentos que serviram de alerta aos tradicionais grandes clubes europeus foi a divulgada proposta do Manchester City para contratar o Kaká.

Antes, clubes como Milan, Barça, Manchester United preocupavam-se em perder suas estrelas para outras equipes de “mesmo porte”, como Juventus, Real Madrid ou Internazionale. Agora, com essa onda de oligarcas russos, xeques árabes, bilionários americanos comprando clubes na Europa (sejam tradicionais ou pequenos), os grandes clubes perceberam que, sem um controle, de uma hora para outra eles podem perder seu status de clubes dominantes no cenário mundial e perderem seus craques para clubes que eles nem imaginavam. Há seis meses, quem poderia imaginar que um jogador como Robinho poderia trocar o Real pelo City ou mesmo especular a ida de Kaká para lá? O que era o Chelsea, internacionalmente, antes do Abramovich? Grandes clubes tradicionais (como Bayern, Ajax etc.) perderam rapidamente espaço para esses novos ricos. E agora, mesmo os mais ricos sentem que já não estão tão seguros assim.

'Salary cap' poderia diminuir a alegria dos atletas?

'Salary cap' poderia diminuir a alegria dos atletas?

A criação de associações como a ECA e a EPFL (associação das ligas profissionais) também é um passo importante para a possibilidade de estabelecer um teto salarial.

Seria impossível adotar tal medida em nível nacional. Para que funcione, o teto salarial deve ser ao menos continental (europeu). Isso porque se a Itália, por exemplo, instituísse um teto em sua liga, a primeira reação dos jogadores seria deixar o país para atuar em outros campeonatos. Portanto essa decisão deve ser tomada de maneira conjunta, ao menos pelas ligas de maior poder econômico.

Não sei quais serão os critérios propostos para tal controle (um valor fixo por jogador, uma porcentagem das receitas proveniente das atividades clubísticas, uma mistura de fórmulas etc.) e imagino que pelo momento nem se discutirá esse tipo de detalhe. Penso que o primeiro passo será avaliar se os clubes europeus, em princípio, estão de acordo com tal forma de controle.

Em se aprovando a idéia, acredito que o segundo passo será criar um grupo lobístico para tentar com que sindicatos de atletas e a própria União Européia aprovem a proposta, pois de acordo com a regulamentação vigente, a imposição de um teto salarial seria uma afronta a acordos trabalhistas, caracterizaria um cartel e seria, portanto, ilegal.

Isso significa que há um longo caminho a ser percorrido, mas estamos na expectativa para ver se o primeiro passo será enfim dado essa semana.

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Respostas

  1. Falando em salário… a CBF acaba de pagar os salários dos jogadores do flamengo:

    O Flamengo pagou na sexta-feira os salários de dezembro do elenco. O dinheiro para quitar a folha, que beira os R$ 4 milhões com os encargos trabalhistas, veio da CBF.

    A medida foi importante porque impediu que jogadores insatisfeitos pudessem entrar na Justiça para pleitear a liberação. Justamente na sexta-feira completariam-se três meses de salários atrasados – dezembro, que acabou quitado, 13º e janeiro – segundo as leis trabalhistas.

    Há uma grande insatisfação do grupo com as pendências financeiras. Recentemente, Marcelinho Paraíba ameaçou abandonar o clube por causa das dívidas.

    http://globoesporte.globo.com/Esportes/Noticias/Times/Flamengo/0,,MUL990995-9865,00-FLA+PAGA+SALARIOS+DE+DEZEMBRO.html

    ta e ai?
    a CBF nao vai pagar as dividas do Grêmio também?

    Confederação Brasileira Flamenguista

    A que ponto chegamos…

  2. Acredito que a proposta é muito interessante, ainda mais que existem exemplos que deram certo em outras entidades esportivas e que podem servir como parâmetros para que se molde uma boa proposta no caso do futebol.

    João, você não acha que faltam entidades, ou maior representatividade das já existentes, aqui no Brasil para que sejam mais discutidas propostas como essas ou outras de interesse dos atletas e dos clubes, acreditando que esta seja uma maneira para catalisar o processo de evolução do nosso futebol?

    Obrigado.

  3. É uma medida arriscada, e que fere diversos interesses. Mais do que criar o teto, acho mais plausível a criação de participação nos lucros, uma vez que não adianta você colocar um teto de U$ 100,000 e o cara devido ao seu futebol gerar mais de U$ 10,000,000.00.

    Tudo na questão da proporcionalidade.

  4. Olá Diego,
    Obrigado pelo seu comentário.

    Como eu disse anteriormente, mesmo se os clubes europeus decidirem ir nesse caminho de controles de salários, o processo será ainda muito longo.

    Deixe-me reforçar que a dificuldade de implantação de um teto salarial no Brasil seria talvez maior do que na Europa, justamente pela concorrência da mesma. Quer dizer, ao menos por enquanto, se houver um controle de gasto na Europa as grandes ligas européias não sofreriam forte concorrência de outras ligas e portanto não perderiam seus maiores astros (talvez um ou outro fosse pros EUA ou outras ligas no oriente médio ou Asia), da mesma forma que a NBA não sofre concorrência de outras ligas de basquete no mundo (mesmo com teto salarial).

    Obviamente, a situação brasileira seria diferente, pois um controle salarial mais acirrado talvez acelerasse ainda mais o êxodo de jogadores brasileiros para o exterior.

    No entanto, o controle na Europa, em si, pode vir a ser benéfico também ao futebol nacional, pois o controle de gastos lá poderia inibir a contratação desenfreada de jogadores estrangeiros… ou não (como diria Caetano).

    Quanto à existência de entidades no Brasil para que se regulamente coisas do tipo, eu acho que já existem (Clube dos 13, CBF, Sindicato de Atletas, etc), mas como já foi dito anteriormente, são inoperantes.

    O comentário do Robert Fernandez no post “Camarote F&N: No vácuo dos clubes” (https://futebolnegocio.wordpress.com/2009/02/05/camarote-fn-no-vacuo-dos-clubes/#comments) dizia de uma proposta corintiana em não trabalhar mais com atletas jovens que ‘pertençam’ a empresários. E eu disse que a idéia só daria certa se todos os outros grandes clubes fossem pelo mesmo caminho.

    Se os clubes parassem só de reclamar da Lei Pelé e percebessem que eles ainda estão com a faca e o queijo na mão (isso se trabalhassem juntos), a situação de nosso futebol estaria bem melhor. Mas parece que o C13 só se reúne para discutir divisão de cotas de TV.

  5. Não precisa de teto salarial. Se não tiver grana liga para a CBF, que ela paga!

    Ao menos é o que está parecendo diante das últimas notícias. Ou será que é só para o flamengo?

  6. Olá Flavio,

    Obrigado por seu comentário.

    Só para esclarecer: o teto salarial nas ligas profissionais em geral não se refere a um limite de valor fixo que se pode pagar a um atleta.

    As fórmulas variam de liga para liga, mas normalmente se referem a uma porcentagem das receitas (operacionais) das ligas (ou clubes). Por exemplo, um time não poderia gastar mais do que, digamos, 90% do que arrecada com folha de pagamento (o que já seria um valor altíssimo para qualquer empresa normal, mas é um gasto ‘modesto’ para muitos clubes de futebol). Aí, se um clube arrecada 100 milhões num ano, ele poderia gastar ‘apenas’ 90 milhões com pessoal. Em teoria, se o clube quiser pagar pagar 30 milhões para um só jogador e dividir os outros 60 milhões entre os outro 20 e tantos atletas, seria problema do clube… se bem que geralmente à regras internas em clubes e ligas para evitar uma grande disparidade de salários (mesmo porque, no fim das contas, isso poderia causar um grande mal-estar no time).

    É claro que os jogadores, através dos sindicatos, têm participação nas decisões de cotas. E se por um lado eles aceitam um teto salarial, normalmente, em contra-partida, eles têm a segurança de um piso salarial também bastante elevado (comumente, algo entre 80% e 90% do valor do teto salarial).

    Portanto, Flavio, vc tem razão: os tetos salariais são estabelecidos, prioritariamente, proporcionalmente à arrecadação das ligas ou clubes.

  7. Olá João,

    Obrigado pelas “hot news” vindas da Europa.

    O assunto wage policy, termo também muito utilizado na Europa para salary cap é extremamente necessário para a saúde financeira do futebol global.

    O G14 sempre apresentou o indicador 55% dos gastos salariais em relação as receitas operacionais geradas ( matchday, media, commercial).

    Nas Ligas Americanas esse percentual ótimo fica entre 55% e 59% em média atualmente, mas há alguns times que ultrapassam esse índice.

    Na prática o indicador wage policy/salay cap deveria contemplar também o valor despendido anualmente pela amortização dos atletas contratados.

    Muitos clubes grandes da Europa que apresentam índice abaixo de 50%, quando inclui o valor da amortização das contratações apresentam substancial aumento nas despesas com seus jogadores.

    Um abraço.

    Amir


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