Publicado por: Amir Somoggi | 31/janeiro/2008

Ídolos no futebol

Prosseguindo com minha análise sobre o modelo vicioso praticado pelo mercado brasileiro de clubes de futebol, com a transferência a granel de seus jogadores, a principal conclusão apresentada no meu último post é que a exportação desenfreada de atletas para o exterior, não está impactando positivamente o mercado doméstico de consumo das marcas dos clubes. 

Esses foram os clubes de futebol no Brasil que mais geraram receitas com os atestados liberatórios nos últimos três anos (2004-2006):

Maiores Receitas Consolidadas – 2004-2006

Atestados Liberatórios – Brasil 

Santos……………………….R$ 130,7 milhões 

Cruzeiro……………………R$ 109,3 milhões 

Internacional-RS…………R$ 91,2 milhões 

São Paulo………………….R$ 70,8 milhões 

Atlético-PR………………..R$ 61,4 milhões 

Fonte: Casual Auditores Independentes

Os dados acima apresentados comprovam que nada menos que R$ 463,4 milhões foi o montante gerado por apenas 5 clubes nos últimos três anos com a transferência de seus jogadores e nem por isso essas entidades conseguiram transformar os seus negócios, já que esses mesmos clubes mantém sua “estratégia” de transferência de seus jogadores a cada ano. Não há a utilização de uma pequena parte desses recursos para a criação de valor para seus negócios em termos de ofertas de entretenimento e consumo de suas marcas.   

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A falta de ídolos no futebol brasileiro vai contra todas as modernas práticas de marketing esportivo no esporte global, já que os astros esportivos são um fator fundamental para a criação de valor para as marcas dos clubes e o estreitamento de vínculos emocionais com os milhões de torcedores / consumidores em todo o mundo. Esse foco nos ídolos globais gera para os clubes estrangeiros bilhões de US$ em receitas com marketing, com seus estádios e em novas plataformas de mídia.

Soluções para o mercado brasileiro – No Brasil, os clubes de futebol têm usado a falta de recursos como argumentação para não manter seus jogadores por mais tempo em nosso mercado. Entretanto uma rápida análise em suas informações financeiras comprova que há recursos disponíveis, como, por exemplo, os milhões de R$ despendidos todos os anos com seus clubes sociais, que poderiam ser investidos no futebol profissional, principalmente na renovação antecipada dos contratos de suas estrelas, com maior apelo comercial. (Há muitos clubes que têm despesas superiores a R$ 12 milhões ao ano com o clube social). 

Além disso, não há no mercado brasileiro uma correta maximização das fontes de receitas dos clubes brasileiros, principalmente na exploração mercadológica da imagem de seus atletas, que poderiam transformar os bons jogadores, em craques em geração de receitas, fazendo com que esses atletas pensassem duas vezes antes de sair de um mercado altamente lucrativo, para irem jogar em locais distantes, com um futebol de terceira categoria e sem nenhuma cobertura de mídia. 

E finalmente, os próprios atletas e seus empresários ainda não perceberam que muito mais importante que seus ganhos com salários ou luvas, o mercado brasileiro oferece aos ídolos a possibilidade de ampliar a remuneração através das receitas publicitárias e com patrocínio, fazendo com que seja mais interessante para todos os envolvidos com o futebol no Brasil que esses atletas permaneçam mais tempo por aqui ou até construam uma carreira de sucesso no mercado brasileiro.

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Respostas

  1. Amir,
    Ótima reflexão, e corroborando com o seu post, podemos apontar que aqui no Brasil as camisas mais vendidas dos principais clubes são as “sem nome nas costas”, ou seja, esse é apenas um pequeno exemplo do resultado puro da sua analise.
    Abraço

    Olá Chico,

    Você está certo. É uma pena que aqui no Brasil o marketing esportivo ainda esteja em um estágio embrionário, principalmente no quesito comercialização das marcas dos clubes atrelada ao carisma e apelo comercial dos ídolos.

    Um abraço.

    Amir

  2. Pessoal , esta questão é tão ampla quanto polêmica, vou resumir alguns pensamentos que tenho a respeito.

    Tanto os atletas quanto seus representantes são pessoas, normalmente, de baixo nível educacional, com pouquíssimo senso coletivo e nenhuma identificação com a sociedade, com o clube, apenas com seus imediatíssimos interesses; são gafanhotos, que após dizimarem os recursos em um lugar, migram para outro.

    O objetivo é conseguir uma transferência já, nem que seja para o Uzbequistão para receber os 10% ou 15% dos US$ 180 mil que um garoto de 16 anos eventualmente valha. Salvo algumas exceções, tem gente séria por aí também, mas são poucos.

    Essa falta de identidade do atleta, a meu ver, cria inúmeras dificuldades em criar ídolos, para via endosso, gerar identificação e consequentemente receitas, o jogador beija tantas camisas em sua carreira hoje em dia que suas bocas e credibilidade devem ficar cheias de “sapinhos”.

    Essa ânsia em fazer dinheiro com os atletas não importa a idade deles, sua condição técnica, física e psicossocial vem tanto da ambição dos empresários, da pressa do atleta e sua família em, muitas vezes, sair da miséria e dos clubes, que por absoluta incapacidade de gerar receitas de diversificadas origens vê nesse modo de ganhar uns trocados a grande tábua da salvação; é uma grande selva, nenhum por todos e todos por si próprios, resultado, todos perdem; não tenho piedade, onde a incompetência e o imediatismo imperam, o resultado não pode ser outro.

    Tenho acompanhado com interesse os movimentos do presidente da UEFA e da FIFA que insistem em suas teses de limitação de estrangeiros nos clubes europeus, essa conversa não acabou ainda e algo vai acontecer apesar da legislação da UE dificultar isso um pouco. Caso haja cotas de estrangeiros na Europa, a fonte das transferências fáceis soferá um grande golpe e essas estruturas voltadas para tal poderão cair no vazio; ou isso será o fim ou a chance, pela qual esperamos tanto, de transformar o futebol por meio da busca de novos públicos e novas receitas.

    Olá Robert,

    Você tocou em um ponto crucial, os empresários não são agentes dos jogadores, que além da carreira esportiva, também são responsáveis pelo pocicionamento do atleta como produto de marketing. Não conehço nenhuma empresa de representação de jogadores aqui no Brasil que desenvolva um plano de carreira para seu atleta fora das quatro linhas.

    Entretanto caso o Brasil queira se desenvolver como indústria de consumo de futebol terá que mudar seu atual panorama, ou então deixemos como está e veremos outros Decos vestindo a camisa de seleções de outros países e quem sabe um dia dentre os milhares de jogadores transferidos surja um novo Pelé, que será o craque de uma Turquia, Ucrânia ou Coréia.

    Um abraço.

    Amir

  3. Prezados,
    acho que a questao do exodo de jogadores, e da falta de estrelas no Brasil, passa tambem por um ponto crucial da Lei Pele: o limite de 5 anos por contrato! Diferente da Lei Bosman, a Lei Pele impede que um clube assine por um jogador por mais de 5 anos, de forma que um contrato assinado com um jogador recem-promovido aos profissionais (18 anos, por exemplo), termina quando o jogador completa 23 anos. Evidentemente, quanto mais tempo de contrato houver pela frente, maior sera o valor de uma eventual multa rescisoria. Desta forma, os clubes sao incentivados a “vender” os jogadores ainda jovens, porque a cada ano que passa o valor diminui, como numa amortizacao de bens tangiveis (foi o caso, por exemplo, da venda do Kaka pelo SPF e do Juan pelo CRF).
    Alem disso, o limite de 5 anos tambem dificulta que os clubes contratem, em definitivo, jogadores de nivel que estao no exeterior. Veja, por exemplo, o caso do Ibson: o jogador tem mais 2 ou 3 anos de contrato com o Porto, que quer aproximadamente R$10M pela eventual rescisao do contrato. Caso o Flamengo decida fazer tal investimento, tera que planejar uma amortizacao contabil em 5 anos (ainda que haja possibilidade de renovacao, este nao eh um fato relevante no momento do desembolso). Ora, ainda que o Ibson seja um craque, nao acredito que nenhum jogador gere um retorno de $2M por ano, excluidas as despesas com salarios. Um clube europeu, por outro lado, poderia planejar uma amortizacao em ate 10 anos, creio eu (por favor, me corrija se eu estiver errado).
    Desta forma, o limite de 5 anos torna impraticavel para os clubes brasileiros competir em igualdade de condicoes com os europeus pelos jogadores com real valor de mercado. Por isso, quando esses jogadores voltam pro Brasil, normalmente o fazem por emprestimo (Adriano, Ibson), ou no final do contrato (Ze Roberto).
    Gostaria de ouvir sua opiniao sobre esse tema, e aproveito para dar os parabens pelo excelente blog.
    Abraco,
    Miguel


    Olá Miguel,

    A sua colocação é pertinente e é muito usada pelos gestores dos clubes por aqui. Entretanto na Europa os contratos também têm 5 anos de duração, amortizados nesse período O problema é que no Brasil os clubes ainda não perceberam que devem gerar receitas exatamente para renovar cada vez mais cedo os seus contratos e investir cada vez mais recursos em seus jovens talentos. Não existe essa história de faltar menos de 1 ano para o contrato se encerrar para que os clubes comessem uma negociação de renovação.

    Por isso, lá na Europa os departamentos de marketing tornaram-se estratégicos para os clubes, já que a ampliação das receitas é o motor para a estruturação do departamento de futebol. Lá os contratos duram no máximo 2,5 anos e já são renovados por mais 5 temporadas.

    Aqui os clubes querem uma reserva de mercado somente para decidir no fim do contrato se vale a pena investir em determinado atleta, um erro, partindo do princípio que o desenvolvimento econômico das entidades é a solução para esse momento que passamos.

    Como conheço bem o nosso futebol, estou certo que o primeiro clube que conseguir criar esse novo ambiente aqui, será copiado pelos demais.

    Um abraço e contamos sempre com sua participação.

    Amir

  4. Amir, desculpe pela possível chatice do meu comentário, pois vou colocar mais problemas do que propriamente apontar soluções.

    O êxodo: paradoxalmente, sou contrário à restrição de entrada de jogadores estrangeiros na Europa. Isso por um lado, pois, por outro, num conflito ainda não resolvido, sou favorável.
    O Brasil tem, grosso modo, 4.000 clubes de futebol. Desses, porém, temos um universo de, vamos lá, com muito boa vontade, 80 a 100 clubes dignos desse nome e que podem ser considerados como geradores e, sobretudo, mantenedores de empregos.
    Se for levar a coisa a ferro e fogo, esse universo restringir-se-á a meros 30, talvez 40 clubes.
    Ora, ao mesmo tempo jogamos no mercado, ano após ano, de 4 a 5 mil jovens em idade de trabalhar e que enxergam no futebol ou que têm no futebol sua opção de vida. Pior: na quase totalidade o futebol nem é opção e sim única possibilidade.
    Futebol é emprego, a rapaziada precisa de emprego e isso não existe no Brasil, não só no futebol como em outras áreas. Melhor dizendo, a oferta é inferior à demanda e é de péssima qualidade em todos os sentidos.
    Portanto, mesmo com os erros, mesmo com as fraudes, mesmo com a garotada que sofre por conta de empresários criminosos, estatisticamente essa é a melhor possibilidade de vida que existe para uma grande quantidade de brasileiros.

    Os craques – bom, como essa palavra virou carne de vaca e qualquer cabeça-de-bagre é craque, vou chamá-los de “diferenciados”, termo igualmente em moda e chique, ainda por cima. Manter um diferenciado no elenco custa caro. Isso gera as inevitáveis reações de ciúme e, num extremo, boicote. Até hoje eu tenho viva na memória a passagem do “trezentinho” Ricardinho pelo São Paulo. É difícil, com a mentalidade média do boleiro tupiniquim, ter um diferenciado no elenco e suportar tudo até chegarem as conquistas. O Boca manteve o Riquelme em 2007 e chegou ao título da Libertadores, passando por umas fases meio brabas. Jogasse ele em um dos nossos grandes e dificilmente teria tido tempo e tranquilidade para mostrar seu futebol, assim como o treinador não teria conseguido montar uma equipe competitiva.
    Uma saída seria, é claro, pagar melhor a todos do elenco. Creio, por sinal, ser a única saída. Mas aí os custos explodem e o futebol ainda não remunera o suficiente para bancar esse tipo de investimento. Lembrando que jogador como Rogério Ceni é caso único, dificilmente será repetido ou poderá servir como exemplo. Ao menos por ora.

    Vivo me perguntando porque nossos clubes ganham tão pouco com ações de marketing. Muitas são as respostas e a indigência mental ou a preguiça diretiva é apenas uma delas.
    Há empecilhos que um clube sozinho não conseguirá mudar.
    Eles vão desde a estrutura arcaica e viciada do nosso futebol, com sua confederação monárquica e federações hereditárias, até o calendário obtuso, em desacordo com o europeu.
    Passa pelos estádios, arapucas mortais ou, com sorte, desconfortáveis.
    Passa pela impunidade, que beneficia a todos, de dirigentes, digamos, incompetentes, a fabricantes e vendedores de produtos piratas.

    E por aí vai.
    Fui chato, mas desculpei-me logo no início.
    Talvez eu seja pessimista em excesso, ou um realista doente, mas, sinceramente, num horizonte de curto e médio prazo não consigo enxergar mudança significativa nesse quadro.

    Por outro lado, como tenho até escrito no Olhar Crônico Esportivo, 2009 poderá vir a ser o ano da “virada”. É o ano em que, salvo eventual catástrofe, teremos o começo da injeção de dinheiro de “gente grande” nos clubes via TV. Todo o atual tititi envolvendo o marketing no Flamengo, Corinthians, Palmeiras e outros clubes, inclusive no Nordeste, demonstra que há um despertar e uma urgência para o assunto.
    Recheada de erros crassos, é evidente, como as mangas da camisa corintiana, como os meses sem patrocínio do Flamengo e a patética exibição de uma marca de patrocinador sem pagamento, e por aí vai. Mas é um começo, um despertar. Talvez contribua para mudar o quadro geral, mas não muito, não radicalmente, não a ponto de mantermos o Adriano no São Paulo, ou mesmo um jogador mediano como o Ibson, no Flamengo.

    Olá Emerson,

    Com todo respeito a seu comentário, você está mais parecido com os nossos dirigentes do que com um analista crítico do mercado do futebol.

    Como você pode ver no meu post anterior cerca de 85% dos recursos gerados com transferências de jogadores estão nas mãos de apenas 21 clubes, os maiores em receitas.

    Se os clubes soubessem gerar receitas com marketing poderiam sim manter seus jogadores pelo tempo que desejassem, sem ter que transferir por qualquer ninharia jogadores que são grandes potenciais de receitas.

    O papel de nosso blog é trazer soluções concretas para solucionar problemas reais do nosso futebol, fazendo com que os clubes compreendam a dimensão de seus negócios.

    Os clubes devem sim investir cada vez mais recursos em suas folhas salariais, trabalhando sempre com o indicador salários / receita, possibilitando que o incremento em seus negócios, seja o alavancador de seus departamentos de futebol.

    Um abraço.

    Amir

  5. Surgiu uma dúvida: aqui no Brasil pode-se fazer um novo contrato de 5 anos no meio de um contrato de 5 anos? Exemplo: aos 18 anos faz um de 5, aos 20 faz outro de 5.

    Uma coisa que deve ser levada em consideração é que não importa o quanto o clube seja estruturado e organizado, se o jogador não quiser jogar ele não vai. Se o jogador quer ir para a Tanzânia, ganhar um pouco mais, e você não vende, ele vai fazer corpo mole e arrumar confusão.
    Já tivemos casos assim.

    Abraços,
    David

    Olá David,

    Seja bem vindo ao blog.

    No Brasil o clube pode fazer um contrato de 5 anos. Caso no meio desse contrato clube e jogador negociem novas cláusulas, esse contrato é substuído por outro que pode ser de até 5 anos.

    Você está certo quando fala sobre a vontade dos atletas, mas todos nós sabemos que em geral eles recebem “orientação” de seus empresários, que nada entendem de como desenvolver um plano de carreira de seus clientes.

    Um abraço.

    Amir

  6. […] Essa questão já foi abordada pelo Amir Somoggi, aqui mesmo no blog, em alguns artigos (“Transferências a granel”; “Ídolos no Futebol”) e pode ser muito bem resumida em um trecho: “A falta de ídolos no futebol brasileiro vai contra todas as modernas práticas de marketing esportivo no esporte global, já que os astros esportivos são um fator fundamental para a criação de valor para as marcas dos clubes”. (https://futebolnegocio.wordpress.com/2008/01/31/idolos-no-futebol/). […]


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